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Mostrando postagens de fevereiro, 2022

Poder legislativo, orçamento e emendas (I)

                 A experiência internacional mostra variadas formas de o órgão de representação (poder legislativo) avaliar, alterar e aprovar os orçamentos. Pesquisa da Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) realizada entre seus membros mostra que, em 18 países, o legislativo tem poder irrestrito de emendar (alterar) a proposta orçamentária do poder executivo; em sete casos, as emendas podem ser aprovadas desde que não alterem o déficit ou o superávit proposto pelo executivo; em um caso, Chile, o legislativo pode apenas diminuir as despesas ou as receitas previstas no projeto; em dois casos, não são admitidas alterações e a proposta orçamentária pode apenas ser aprovada ou rejeitada como um todo; nos demais seis países, aplicam-se normas variadas (p. ex., na Australia, são admitidas emendas apenas nas novas políticas públicas).             Curiosamente, países social, cultural e etnicamente próximos adotam regras opostas: nos Estados Unidos, as casas do Congr

O poder legislativo e o orçamento

          O orçamento público é uma criação do poder legislativo.  Na Inglaterra feudal, em 1215, a Magna Carta concedeu aos barões o poder de autorizar a cobrança de tributos e, mais tarde, em 1689, a Bill of Rights , estabeleceu também a competência de o Parlamento definir a aplicação dos recursos. Nasceu assim o direito orçamentário. Nos Estados Unidos, desde a Independência até o início do Século XX, as comissões de orçamento da Câmara dos Representantes e do Senado Federal mantiveram total controle sobre a elaboração e aprovação do orçamento federal. A partir de 1921, o extraordinário crescimento da máquina administrativa pública e a complexidade que assumiu o orçamento, levou o Congresso a admitir uma proposta de orçamento elaborada pelo presidente.         No Brasil, a Constituição de 1891, certamente inspirada no modelo norte-americano, definiu que a Câmara dos Deputados teria a iniciativa do processo orçamentário, devendo a cada ano responsabilizar-se pela elaboração e apre

Quem se interessa pelo orçamento público? (II)

             A principal forma de participação política da população dá-se por meio da votação e da eleição do chefe do poder executivo e dos que integram as casas legislativas. Elege-se, assim, prefeito municipal, governador do estado, presidente da República, vereadores, deputados estaduais e federais e senadores. O eleitor escolhe e vota nos candidatos que, acredita, melhor defenderão os seus interesses e o seu ideário político. A representação escolhida por meio do voto, entretanto, é vista pelo eleitor apenas como um ponto de partida. Tanto no executivo como no legislativo, para que as reivindicações tenham maior chance de atendimento, elas devem ser apresentadas e defendidas pelos eleitores organizados em grupos de pressão. Quanto mais articulados na defesa de interesses de corporações de todo o tipo, de entidades econômicas, de grupos sociais, de associações de apoio a políticas públicas etc., maior será a possibilidade de o grupo de pressão alcançar os resultados pretendidos.

Quem se interessa pelo orçamento público? (I)

              Le budget, monstre enorme, admirable poisson à qui de toutes parts on jette l’hameçon .  Os versos de Vitor Hugo, escritos em 1836, podem ser assim traduzidos:  Orçamento, monstro enorme, peixe admirável, para fisgá-lo todos lançam seus anzóis/ 1 . Há clara mensagem nesta metáfora: o conteúdo enorme do orçamento é disputado por muitos interessados.                 No sistema federativo brasileiro, em princípio, os cidadãos têm interesse na elaboração, aprovação e execução de três orçamentos gerais:  do município, do estado da federação e da União. Além de amparado legalmente, o interesse é totalmente legítimo já que os cidadãos pagam os tributos que constituem as receitas desses orçamentos.                Allen Schick escreve que há dois elementos centrais na elaboração  orçamentária:  reivindicações  e  alocação dos recursos / 2 . Interesses e reinvindicações não são sinônimos. De que forma os interessados podem canalizar  reivindicações  junto ao setor público na expect

Objeto e objetivo do blog (II)

        Na postagem anterior, afirmou-se que há teorias e modelos que modernizam os orçamentos públicos, transformando-os em instrumentos de auxílio a gestão voltada ao cumprimento de metas e alcance de resultados. Afirmou-se, também, que as normas e regras que disciplinam o processo orçamentário no Brasil estão alinhadas a esses novos conceitos. Ao final, faz-se referências às duas naturezas do orçamento público: técnica e política .         Em todo o lugar, o processo orçamentário público é o resultado das normas e regras, ou seja, do que está prescrito, e que são interpretadas, atenuadas e aplicadas segundo ordens e interesses de natureza política.         Aaron Wildavski (1974) exprimiu assim a importância do orçamento como instrumento político: “ No sentido mais integral, o orçamento reside no coração do processo político ”. O valor extraordinário do orçamento na apreciação política, faz com que questões técnicas, ainda que prescritas, se necessário, sejam minimizadas ou desc

Objeto e objetivo do blog (I)

Neste blog , o foco da atenção é o orçamento público. O sociólogo alemão Rudolf Goldscheid escreveu em 1925: “todo o problema social e, de fato, todo o problema econômico é, em última análise, um problema financeiro”. A mensagem é clara: solucionar ou diminuir a gravidade de problemas de qualquer natureza depende de capital, ou seja, de recursos financeiros. Os países ou os Estados nacionais, como conhecemos, no início, eram impérios ou reinos criados por razões de segurança. Progressivamente, ao lado dessa finalidade, os governos passaram a atender as necessidades da população. A urbanização, o crescimento populacional e os problemas econômicos e sociais ampliaram as funções e a organização administrativa do Estado. As receitas e as despesas públicas também cresceram, mas em proporção menor do que as necessidades. A consequência em todos os governos têm sido os déficits orçamentários e dívidas públicas sempre maiores. A aprovação de leis orçamentárias tem uma história de mais de d

Dinheiro, finança e orçamento

O dinheiro, ou a finança, é uma criação relativamente recente na vida humana. Por meio de trocas (escambo) as pessoas resolviam suas necessidades de bens e de serviços. Trocavam-se serviços por mercadorias e mercadorias por mercadorias. Tributos também eram pagos com bens e com a prestação de serviços. Entre povos vizinhos e de comunidades próximas, o processo de trocas era eficiente. Com o crescimento da população e, principalmente, quando o comércio passou a se dar entre povos e nações, o mecanismo do escambo deixou de atender as necessidades.         A criação do dinheiro resolveu o problema dos pagamentos e as trocas foram progressivamente abandonadas. A questão passava a ser a respeitabilidade do dinheiro e um emissor de moeda confiável significava que o seu dinheiro seria amplamente aceito. A difusão dessa forma de pagamentos ampliou os negócios em escala jamais vista. A utilização regular do dinheiro estabeleceu a dimensão financeira na vida das pessoas e das organizações, p