Quem se interessa pelo orçamento público? (I)

           Le budget, monstre enorme, admirable poisson à qui de toutes parts on jette l’hameçonOs versos de Vitor Hugo, escritos em 1836, podem ser assim traduzidos:  Orçamento, monstro enorme, peixe admirável, para fisgá-lo todos lançam seus anzóis/1. Há clara mensagem nesta metáfora: o conteúdo enorme do orçamento é disputado por muitos interessados. 

            No sistema federativo brasileiro, em princípio, os cidadãos têm interesse na elaboração, aprovação e execução de três orçamentos gerais:  do município, do estado da federação e da União. Além de amparado legalmente, o interesse é totalmente legítimo já que os cidadãos pagam os tributos que constituem as receitas desses orçamentos.

            Allen Schick escreve que há dois elementos centrais na elaboração  orçamentária:  reivindicações e alocação dos recursos/2. Interesses e reinvindicações não são sinônimos. De que forma os interessados podem canalizar reivindicações junto ao setor público na expectativa de serem atendidas no processo orçamentário? A experiência mostra que, entre as reivindicações apresentadas, parte pequena será avaliada e aprovada para atendimento e os recursos correspondentes serão alocados no orçamento.

            A participação política, tema caro à ciência política, traz luz a essa questão. Votar nas eleições é sempre visto como a principal forma de participação política. Menos nas eleições proporcionais e mais nas eleições majoritárias, o voto representa apoio a determinada plataforma política ou plano de governo que, em princípio, deve contemplar políticas públicas e programas orçamentários. O governante-eleito estará, assim, comprometido com o atendimento dos interesses e das reivindicações de seus eleitores.

            Participação em conselhos de órgãos oficiais, criados por lei, consultivos e, principalmente, deliberativos, são formas de participação política direta que facilitam o atendimento de reivindicações. O cidadão-conselheiro busca benefícios não para si, mas para o setor representado pelo conselho ou órgão coletivo. A participação política direta é facilitada quando há maior aproximação entre o eleitor e o político gestor público. Exemplos são as formas de administração participativa e, principalmente, os orçamentos participativos que funcionam no âmbito municipal.  Entretanto, seja no caso de órgãos colegiados ou assembleias e conselhos de gestão ou de orçamento participativo o número de cidadãos participantes é proporcionalmente pequeno. (Continua no próximo blog)

/1 Citado em STOURM, René (1889). Le budget. Son histoire et son mécanisme. Paris: Guillaumin, p. 3.

/2 SCHICK, Allen (1988). An inquiry into the possibility of a budgetary theory. In: Rubin, I. S. (ed.) New directions in budget theory. New York: State University of New York Press, p. 63.

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