O STF e a inconstitucionalidade do “orçamento secreto”

Em dezembro de 2022, a ministra Rosa Weber, relatora das ADPFs e presidente da Corte, marcou a sessão para o julgamento final da matéria. Por maioria, as emendas de relator-geral aos projetos de leis orçamentárias anuais da União foram julgadas inconstitucionais. Parte dos ministros consideraram que as emendas poderiam ser admitidas desde que atendessem aos princípios da administração aplicados à despesa pública, como eficiência, transparência, publicidade e isonomia.

Em detalhes, foi a seguinte a decisão do STF:

“(a) declarar incompatíveis com a ordem constitucional brasileira as práticas orçamentárias viabilizadoras do chamado “esquema do orçamento secreto”, consistentes no uso indevido das emendas do Relator-Geral do orçamento para efeito de inclusão de novas despesas públicas ou programações no projeto de lei orçamentária anual da União;

“(b) declarar a inconstitucionalidade material do art. 4º do Ato Conjunto das Mesas da Câmara dos Deputados e do Senado Federal nº 1/2021 e do inteiro teor da Resolução CN nº 2/2021;

“(c) conferir interpretação conforme às leis orçamentárias anuais de 2021 (Lei nº 14.144/2021) e de 2022 (Lei nº 14.303/2022), vedando a utilização das despesas classificadas sob o indicador orçamentário RP 9 para o propósito de atender a solicitações de despesas e indicações de beneficiários realizadas por Deputados Federais, Senadores da República, Relatores da Comissão Mista de Orçamento (CMO) e quaisquer “usuários externos” não vinculados aos órgãos da Administração Pública Federal, independentemente de tal requisição ter sido formulada pelos sistemas formais ou por vias informais (cabendo, ainda, aos Ministros de Estado titulares das pastas beneficiadas com recursos consignados sob a rubrica RP 9 orientarem a execução desses montantes em conformidade com os programas e projetos existentes nas respectivas áreas, afastado o caráter vinculante das indicações formuladas pelo relator-geral do orçamento, nos moldes do art. 2º, § 1º, do Decreto nº 10.888/2021);

“(d) determinar, a todas as unidades orçamentárias e órgãos da Administração Pública em geral que realizaram o empenho, liquidação e pagamento de despesas classificadas sob o indicador orçamentário RP 9, nos exercícios financeiros de 2020 a 2022, a publicação dos dados referentes aos serviços, obras e compras realizadas com tais verbas públicas, assim como a identificação dos respectivos solicitadores e beneficiários, de modo acessível, claro e fidedigno, no prazo de 90 (noventa) dias.”

Durante o julgamento, quando faltava o voto de dois ministros e o resultado apontava 5 a 4 pela inconstitucionalidade, às pressas, o Congresso Nacional aprovou nova Resolução com o objetivo de garantir maior transparência às emendas de relator-geral e, assim, contar com os dois votos restantes.

A Resolução estabelecia que pelo menos metade das indicações do relator-geral deveriam ser em ações e serviços públicos de saúde, educação e assistência social. As emendas correspondentes a outra metade passariam a ser indicadas pelos seguintes patrocinadores: (a) até 5% pelo relator-geral e pelo presidente da CMO; (b) até 7,5% pela mesa diretora do Senado Federal; (c) até 7,5% pela mesa diretora da Câmara dos Deputados; (d) até 23,33% pelos senadores; e (e) até 56,66% pelos deputados. Nos dois últimos casos, a distribuição obedeceria a proporcionalidade partidária.

A Resolução não foi capaz sensibilizar a Corte que, por maioria – seis a cinco – votou pela inconstitucionalidade das emendas de relator-geral. Esta decisão determinou a alteração do relatório e do substitutivo do projeto de lei orçamentária para 2023, que se encontrava finalizado e pronto para votação na Comissão Mista de Orçamento e no Congresso Nacional.  Para tanto, dispositivos foram incluídos na Emenda Constitucional nº 126, aprovada também em dezembro de 2022 e apreciada de maneira célere a pedido do governo que tomará posse em janeiro de 2023. Os R$ 19,4 bilhões de reais que constavam como emendas de relator-geral foram divididos em duas partes: metade foi compor o montante destinado as emendas individuais e a outra metade será alocada pelo relator-geral em ações constantes do projeto de lei do orçamento.


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